27 de maio de 2016

Alterações e Inovações nos Mini-Ciclos de Leccionamento

   Os habituais cumprimentos a todos os leitores, sejam eles também habituais ou assim não tanto. Um pouco para contrastar com o tom excessivamente demagógico e superficial da minha entrada anterior, estamos aqui reunidos não para celebrar um qualquer matrimónio, mas para debater, se não se importarem de o fazer, eventuais alterações ao paradigma dos Mini-Ciclos de Leccionamento, nomeadamente umas que surgiram em debate com alguém que talvez esteja a ler isto, ou talvez não, não sei, bom, enfim, alterações que dizem respeito às questões dos exercícios na plataforma.

   Para aqueles que não leram, ou que, enfim, não têm tão bem presente, o texto dos Mini-Ciclos, há a tal questão de, idealmente, a verificação do conhecimento dos alunos (não é uma avaliação) ser efectuada por intermédio de uma plataforma on-line, que verificaria as respostas logo ali et cætera. Ora, a questão é que, conforme a pessoa que despoletou toda esta questão me fez ver com o que disse, impor um conjunto fechado de exercícios seria bastante limitativo para a liberdade pedagógica dos professores (e, acrescentaria eu agora, geraria um ensino ainda mais maquinizado do que o que temos hoje, no sentido em que a forma de pensar dos alunos seria ainda mais moldada para o tipo de raciocínios exigidos pelos exercícios “oficiais”). Então, temos de acrescentar mais um grau de complexidade a esta questão (por si só, já complexa) da plataforma.

   A ideia seria que cada professor pudesse propor os seus exercícios, sem mais dificuldade que a de os escrever ou criar e depois submeter. Esses exercícios ficariam, então, numa “zona de testes” (trocadilho não intencional…), à qual só os professores poderiam aceder, para serem sujeitos a modos que a um peer review, ou seja a uma revisão pelos pares. Por outras palavras: os professores com conhecimentos para isso iriam verificar se os exercícios em causa se coadunam com o que seria suposto testarem. Depois, uma vez revistos e aprovados um número suficiente de vezes (será discutível quantas, mas, não sei, 5? 10?), passariam a poder ser utilizados em contexto de aula, consoante o professor que a desse os seleccionasse (já agora, a revisão pelos pares mais ou menos impede que um professor menos bem intencionado lixe os alunos ao seleccionar apenas exercícios com um grau de dificuldade exagerada e cruelmente elevado). Claro, haveria sempre a hipótese de professores e/ou alunos reportarem exercícios que lhes pareçam desadequados, e esses exercícios reportados regressariam à “zona de testes” para serem revistos e, se necessário, corrigidos.

   Adicionalmente, faria todo o sentido se se dedicasse uma parte do horário dos professores (digamos, meia hora, ou uma hora, ou coisa que o valha) precisamente à revisão de exercícios, no sentido de garantir a maior quantidade possível de exercícios disponíveis, com a maior qualidade possível. Outro aspecto que talvez não seja, de todo, descabido é a hipótese de se propor os exercícios sob a forma de um framework, de uma template, de um (raios partam estes estrangeirismos!) modelo que indicasse à plataforma, através de condições, listas, fórmulas ou quaisquer outras artimanhas de programação, várias hipóteses de valores, opções ou situações (ou seja o que for que seja necessário) para se construir o exercício (bem como, claro, chegar à sua solução…). Por exemplo, para um exercício que pretendesse aferir a capacidade de resolver equações do 2.º grau, seriam dadas indicações no sentido de escolher a, b e c (em ax²+bx+c) de modo que b²–4ac não fosse negativo (isto, claro, se se pretendesse trabalhar exclusivamente com números reais…).

   Seria, então, isto. Como sempre, estejam à vontade de dizer o que acham e o que pensam, no espaço de comentários aí em baixo, e, se a isso estiverem dispostos, podem até dar mais sugestões, quer nesse mesmo espaço de comentários, quer através dos meios indicados nos Contactos.

   De resto, daqui me despeço, até à próxima entrada, se conseguir achar um tema conveniente (espero que sim!)…

24 de maio de 2016

Apelo Novo Apesar de Repetido

   Jovens de todo o país, sei que não me ouvem, sei que não me têm ouvido, mas dirijo-me a vós na mesma, outra vez.

   Está a aproximar-se, não é? Está a aproximar-se mais uma época de exames, mais um ano, mais uma tortura. E vocês, mesmo que resmungando, encaminham-se para essa tortura, como se fosse prazer e não suplício, sorrindo alegremente e encolhendo os ombros face ao inevitável.

   Mas será esse inevitável mesmo inevitável? Não, raios, mil vezes não! Não há leis universais que ditem a obrigatoriedade de um exame, só há a tradição, o hábito, o costume, o paradigma, e nada disso é inevitável!

   Jovens, sei que estão todos ansiosos pelo futuro que querem, ou que pensam que querem, ter, sei que estão todos ansiosos por se livrarem de mais um sofrimento, o mais rápida e indolormente possível, mas eu, que olho e olhei talvez um pouco mais em frente, digo-vos, aviso-vos, que não será este o último sofrimento. Atrás dele vêm outros, e outros, e outros, e o futuro que (vos) pintam de cor-de-rosa tem mais espinhos que pétalas…

  Então, jovens, querem mesmo esse futuro? Querem mesmo chegar a um dia em que definham numa cama de hospital, e olham para trás, para a vossa vida, e vêem que, do início ao fim, o mundo manteve-se tal e qual, a mesma porcaria de sempre?

   Ou querem deixar a vossa marca sobre este planeta, sobre este Universo, e fazer alguma coisa com significado? Fazer algo que melhore as coisas para vocês e para todos, sem “mas”, sem “senão”, sem “e se”?

   Está nas vossas mãos: suportarem cada um individualmente e todos em geral um tormento injustificável, ou mobilizarem-se e agirem no sentido de demonstrar às tradições, e aos lobbies, e aos poderes instituídos, que já não toleram mais torturas, que já não suportam mais sofrimentos. Está nas vossas mãos: deixar as coisas como estão, ou mudar o ensino em Portugal para uma coisa melhor.

   Então, jovens, escolham bem: porque, independentemente de tudo o resto, o melhor momento para a mudança é sempre o agora.

   Abaixo os exames nacionais!

   (P.S.: As minhas desculpas aos leitores que esperavam uma entrada com mais pés e cabeça, sobretudo depois desta interrupção… Se serve de desculpa, ou de atenuante, aproxima-se a famigerada, ignóbil e execrável época dos famigerados, ignóbeis e execráveis exames nacionais, e, nesse sentido, foi em mim reavivada a urgência de combater este marco tão simbólico do actual paradigma de ensino e das cruéis imposições que dele advêm; além disso, além de sem tempo – já se sabe o que acontece normalmente nestas últimas semanas de aulas –, também tenho andado sem temas, pelo que, tendo-me lembrado disto, aproveitei. Em todo o caso, espero que voltem algures para a semana, quando espero já ter preparado uma entrada mais apresentável… Então, até à próxima, se me derem o enorme privilégio de me continuarem a ler…)

10 de maio de 2016

Do Público e do Privado

   As minhas mais calorosas saudações a todos vós, caros leitores. Espero que não tenham passado despercebidas a nenhum de vocês as notícias que ultimamente têm surgido relativamente às questões do ensino público versus ensino privado, e da cessação dos contratos de associação. Este é uma tema inerentemente muito politizado, e isso demoveu-me, durante algum tempo, de escrever sobre ele, mas ao ver que estava a ser tão falado, não resisti a fazer uma entrada sobre isto. Provavelmente, já venho um pouco tarde, porque o tema talvez já esteja a perder destaque nos media, estando a ser substituído por outros de maior relevância (ou talvez até nem tanto…), mas isso pouco me importa… Por isso, caros leitores, e se não vos incomodar muito o meu desfasamento, prosseguirei para uma (moderadamente superficial) reflexão sobre todas as questões em torno do ensino público e privado e das relações entre ambos.

   Antes de mais, convém destacar que a minha apolitização (voluntária) implica que me absterei de tecer quaisquer comentários relativamente à desejabilidade ou indesejabilidade da decisão de cessar os contratos de associação (ainda que seja sempre importante frisar que é de suprema importância que os alunos em nada saiam prejudicados, ou seja, que não vejam a continuidade da sua aprendizagem ser interrompida por uma mudança de escola forçada; é certo que também há outros factores que causam mudanças forçadas de escola, mas isso, sendo igualmente indesejável, não pode justificar mais indesejabilidades…), e, por outro lado, a temática específica deste blog (e o facto de ainda não ter elaborado nenhum paradigma social alternativo de uma forma suficientemente pormenorizada e sistematizada para o poder apresentar) também me obriga a não exprimir qualquer tipo de opinião relativamente à desejabilidade ou indesejabilidade da existência de coisas públicas e de coisas privadas per se, in abstractum (perdoem-me a vaga de latinismos…).

   Já antes aqui falei do Negócio do Ensino, ou seja, do facto de, em última análise, o actual sistema de ensino ter uns quantos aspectos que servem mais para alimentar determinados nichos económicos que para seguir aquele que é, ou deveria ser, o seu principal propósito, o tal de ensinar (eu sei que digo sempre o mesmo, mas nunca é de mais frisar aquilo que é óbvio, mas foi esquecido…). O ensino privado não foge a essa regra: a não ser nos casos em que estejam ligadas a iniciativas filantrópicas e/ou solidárias, parece-me lícito assumir que todas as escolas privadas têm como principal (não direi “único”, mas acho que anda lá perto…) propósito dar lucro. O que, convenhamos, no actual paradigma social, até que nem é mau: mais circulação de dinheiro faz, pelo menos em teoria, crescer a economia, o que gera mais circulação de dinheiro, e por aí fora, num ciclo mais ou menos positivo e benfazejo; o problema é que nem todo esse lucro retorna à economia (há bolsos que se enchem e contas em locais mais ou menos longínquos e exóticos que se alargam…), mas isso é outra história…

   Por outro lado, no ensino público, esse propósito lucrativo não é tão preponderante (poder-nos-íamos questionar acerca da questão do preço das folhas de teste, de impressos diversos com fins burocráticos diversos e dos pedidos de inscrição e de revisão de exames nacionais, mas nem vale a pena ir por aí…), mais que não seja porque o ensino público nada mais é que uma pseudo-divisão de uma pseudo-empresa mais abrangente, que é o Estado, que, esse sim, já pretenderá ter lucro (ou melhor, balanço positivo em termos de receita e despesa, o que não é exactamente o mesmo, mas é suficientemente parecido para ser quase igual…). Mas, claro, o ensino público (e também o privado) contribui indirectamente para outros lucros: das editoras, das papelarias, das áreas comerciais que possam vender material escolar…

   Pronto, tudo isto para dizer que é perfeitamente compreensível que, ao abrigo do actual paradigma social, os estabelecimentos de ensino privado sejam negócios e não instituições ao serviço da comunidade. Mas agora, será isso desejável? Eu… diria que nem por isso. É que, independentemente de questões legais diversas (a Constituição Portuguesa, a Declaração Universal dos Direitos do Homem e outros documentos de cariz e carácter semelhante), poderemos todos concordar que ensinar é benéfico não só para o ensinado (porque adquire conhecimento, o que é bom – o actual sistema de ensino é que tende a torná-lo mau, mas não vou por aí, porque já sabem onde é que isso vai dar…), mas também para a sociedade em que este se insere (porque cidadãos com mais conhecimentos podem, à partida, tomar decisões melhores e, eventualmente, desenvolver mais ideias para melhorar a sociedade, embora o conhecimento não seja condição necessária nem suficiente para nenhuma destas coisas), e isto implica que ensinar é um serviço que prestamos a todos. Portanto, pode-se dizer que o ensino privado acaba por ser, na maioria dos casos, fruto de uma atitude a priori (mais um latinismo; desculpem lá, mas parece que hoje embiquei para aí…) errada, que é a de ver o ensino como uma oportunidade de prestar um serviço a alguém (cobrando-lhe por isso) e não a todos (logicamente, sem lhes cobrar).

   Mas, enfim, não se pode propriamente dizer que venha grande mal ao mundo só por causa disso… Teoricamente falando, e tendo em conta o actual paradigma social de mercado livre (que me absterei de classificar como “certo” ou “errado”), faria sentido que qualquer um pudesse abrir as escolas que quisesse, desde que, para isso, cumprisse os requisitos legais, tivesse o pessoal necessário e dispusesse dos meios financeiros para manter tudo a rolar, garantindo-se, também, que os alunos dessas escolas estariam em pé de igualdade, em termos de conhecimentos e capacidades, entre si e relativamente aos alunos das escolas públicas. E é aqui que está o principal problema. Se os privados (não sei bem em que proporção, mas diria que de uma maneira geral) tendem a ter melhores condições, melhores professores e melhores apoios (o que, teoricamente, se traduziria em melhores resultados), isso é mais falha da escola pública (e, inerentemente, do Ministério da Educação e do Estado) do que culpa dos privados, mas, por outro lado, havendo dinheiro envolvido (e, por vezes, em quantias não tão insignificantes assim…), nunca se poderá descartar a hipótese de favorecimentos indevidos, o que, mesmo sendo, por vezes, mais estigma que facto (até porque deverá haver, algures, instituições idóneas…), não deixa de ser fonte de potenciais desigualdades de circunstâncias. Muitos diriam que é aqui que entram os exames, mas a esses direi que é (relativamente) fácil efectuar-se um treino específico para se ter melhores notas (não nos esqueçamos de que, na maioria dos casos, as escolas privadas terão mais facilidade em arranjar salas, professores e horários para apoios diversos, chegando a ter, segundo creio, segmentos do horário dos alunos pré-designados para isso), e também que há sempre a hipótese de fraudes e auxílios teoricamente ilegais durante o próprio exame (isto é mais especulativo que comprovado, mas talvez haja algum fogo por detrás deste fumo…). Mas pronto. Se não houvesse notas que se pudessem falsificar nem exames para defraudar, não haveria estes problemas, e estaria, assim, reposta a igualdade. E, se me perguntarem a mim, o melhor seria mesmo os Mini-Ciclos de Leccionamento (desculpem, mas, mais uma vez, não resisti…), e, aí, talvez se pudesse saltar mais ou menos livremente entre público e privado, ou talvez a relação entre ambas algo mais exótico, que agora não posso imaginar.

   Partindo, então, do pressuposto de que ensino público e privado estão em pé de igualdade (o que, ao fim e ao cabo, é um grande prossuposto de se partir…), só por muito má vontade diríamos que os alunos (e/ou respectivas famílias) não poderiam ser livres de escolher entre escolas públicas e privadas, desde que, claro, houvesse disponibilidade financeira para tal. Nesse sentido, se se der o caso de, numa dada região, a rede de escolas públicas não ser suficiente para suprir as necessidades locais (seja pela baixa oferta, seja pela elevada procura…), seria perfeitamente lícito que se recorresse à rede de escolas privadas para colmatar as falhas, desde que isso não representasse um encargo adicional para as famílias, até porque a educação deve ser tendencialmente gratuita e tal. E, ou muito me engano, ou isto correspondia aos contratos de associação.

   Mas a questão é que isto não deve ser visto como uma solução permanente, mas sim temporária, porque (precisamente por a educação dever ser tendencialmente gratuita e tal), acaba por ser o dever do estado garantir que todos os cidadãos têm acesso a uma escola, e, nesse sentido, a forma mais eficiente (economicamente falando) de o fazer deverá passar por ser o próprio governo a criar e suportar todas as infra-estruturas necessárias, o que corresponde a manter a rede de escolas públicas. Assim sendo, o que se fez, que foi fechar escolas públicas e depois pagar aos privados para terem os alunos, não é, de todo, o mais desejável, até porque, se não estou equivocado, ficou-se a pagar mais aos privados do que se pagaria pela mesma turma no público. Está bem que as escolas privadas, pelas suas especificidades intrínsecas, são capazes de ter mais custos de funcionamento, mas também não me posso impedir de perguntar até que ponto não houve abotoamentos, ou seja, presentes (e não falo daquilo que os cães fazem) a certas e determinadas pessoas, que ocupam certos e determinados cargos, para decidirem de uma certa e determinada forma… Mas isto já é política, e não vale a pena irmos por aí.

   Mas também não podemos ignorar uma potencial objecção, relativamente relevante, à inexistência do ensino privado, ou, pelo menos, de escolas independentes do Estado. É que, independentemente de teorias da conspiração diversas, não podemos descartar nunca a possibilidade de se utilizar o ensino como instrumento de manipulação e condicionamento mais ainda do que agora é, e, nesse sentido, deixar tudo nas mãos do Estado (que, nessa possível distopia, seria a fonte primária e o principal beneficiário dessa manipulação e desse condicionamento) é acelerar, se me permitem o exagero lírico, os seus nefastos planos. Mas não nos iludamos: também não é tão difícil assim chegar a um gentlemen’s agreement com os possíveis donos das possíveis escolas privadas no sentido de garantir que a manipulação e o condicionamento também aí ocorram…

   Outra questão que se torna difícil de evitar é a dos apoios estatais às famílias que, por opção, pretendam pôr os seus filhos a estudar nos privados, mas que, na mesma, são taxadas para (entre outras coisas, claro…) assegurar a educação dos filhos, e não recebem qualquer benefício disso. Uns colmatam as falhas dos outros, e tudo o mais, mas percebe-se que possam reclamar o direito de escolher a educação dos filhos e ser ressarcidas do que lhes foi indirectamente cobrado, para uma despesa que, para elas, é perfeitamente desnecessária. Eventualmente, poder-se-iam sugerir várias soluções, desde as mais simples, como seja o estado contribuir com o mesmo dinheiro que gastaria com os alunos em causa na pública para pagar, em parte, as mensalidades da privada, até às mais complexas, como criar um qualquer outro sistema de contribuições que também tenha em atenção o uso que se faz dos serviços públicos, mas isto já tem demasiado a ver com alterações do paradigma social e, como disse, isso é uma coisa que, pelo menos aqui, pelo menos por agora, não quero abordar.

   Então, depois de tudo isto, em que é que ficamos? Haver públicos e privados é bom ou mau? Diria, se me permitem a ambiguidade e inconclusividade, que depende muito das circunstâncias, mas também que essa distinção é, em última análise, marca e consequência da actual organização da sociedade, que, possivelmente, não será, por si só, inteiramente livre de erros, pelo que, à semelhança do actual sistema de ensino, talvez esteja a precisar de umas quantas alterações… Talvez um dia debateremos isso, mas não será hoje…

   Então, despeço-me, sem mais assunto, sem mais vontade, sem mais inspiração, até à próxima entrada…