25 de dezembro de 2016

Dos Insucessos de Percurso do Percurso de Sucesso

   Caríssimos leitores, como se vos apresenta a vida, nesta que será para muitos uma época festiva (e, para outros, apenas mais uma época de observação da alegria e da simpatia, porventura com um não desprezável grau de hipocrisia à mistura, de pessoas alheias)? Pela minha parte, tenho a lamentar mais um relativamente longo período sem produzir nada de novo, mas podem considerar esta (se ligarem a isso) a minha prenda para vós: uma nova entrada. E que coisa melhor para fazer nesta época de (aparente) paz e tranquilidade que criticar? É certo que tenho procedido de igual modo nas outras épocas todas, mas… enfim, adiante. O tema que quero trazer para a mesa é o do Percurso de Sucesso, precisamente o tal parâmetro, ou indicador, ou seja lá o que seja, que em vago destaque esteve agora por causa dos rankings deste ano (ou melhor, do ano passado…).

   Antes de mais nada, a indispensável ferroada a priori no actual sistema de ensino: isto dos rankings é, na esmagadora maioria dos casos, mais prejudicial do que benéfico, no sentido em que leva as escolas a esforçarem-se ao máximo para se superarem mutuamente (porque, e corrijam-me se já estiver desactualizado, um melhor ranking acaba por acarretar melhor financiamento), o que seria positivo se não fosse o caso de essa mútua superação ser tentada com prejuízo dos alunos, seja por um aumento da exigência (na esperança de que tal acarrete uma melhor prestação nos exames nacionais, que, com ou sem percurso de sucesso, continuam a contar para o ranking), seja por um aumento da carga de trabalho (com preparações intensivas e treinos intensivos e torturas intensivas afins, igualmente com vista à melhoria dos resultados nos exames, mas que, apesar disso, podem constituir – e diria mesmo que constituem – fonte de desconforto para os alunos…). E isto, claro, para não falar da eventual falta de representatividade dos rankings, tendo em conta a vasta gama de manigâncias que se pode fazer em termos dos resultados dos alunos…

   E é precisamente este aspecto que permite introduzir na conversa do percurso de sucesso: se já antes se deflacionavam notas internas, para impedir descidas mais significativas nas notas dos exames nacionais (o que, se não me falha a informação, poderia prejudicar as estatísticas), agora essa deflação será ainda mais pronunciada, no sentido de garantir (ou, pelo menos, demonstrar) que há evolução do aluno, o que, se não estou em erro, é precisamente o que visa medir esta coisa do percurso de sucesso. É claro que, de um ponto de vista mais ou menos ideal, genérico e abstracto, faz pleno sentido tomar em consideração o desempenho do aluno ao longo do seu percurso escolar, no sentido de tentar aferir se uma escola está a desempenhar bem a sua tarefa de desenvolver as capacidades e conhecimentos dos alunos; o problema é que, como bem sabemos, ou bem deveríamos saber, os instrumentos utilizados para reflectir esse mesmo desempenho (as notas, isto é, aqueles numerozitos da treta que se escrevem naquele papelito da treta, com o devido respeito a todas as coisas oficiais em torno disso…) não são, nem de perto, nem de longe, nem infalíveis, nem inalteráveis. Por outras palavras, acaba por não ser tão impossível assim compor as coisas do modo que mais convenha, independentemente de como são na realidade… É claro que esta generalização peca por injusta; não serão (espero eu…) tão reduzidos assim os casos onde não há qualquer tipo de manipulação dos resultados, e, nesse sentido, nem com percurso de sucesso nem sem percurso de sucesso sairão os alunos prejudicados. Porém, há a tal questão de uma maçã podre estragar o conjunto (se os senhores anglo-saxónicos me perdoam o desavergonhado roubo de expressões idiomáticas), e, nesse sentido, será mais ou menos inegável que os alunos, ou que pelo menos alguns alunos, sairão (mais) prejudicados (ainda) com o percurso de sucesso.

   Que fazer, portanto? Um novo sistema de ensino! Agora a sério, um novo sistema de ensino, e um novo sistema de ensino muito particular, para ser mais específico. É que se acabavam logo com estras coisas, quer por o próprio conceito de escola como entidade independente que tem de se sustentar sozinha durante um ano lectivo desaparecer (mais que não seja porque não haveria propriamente anos lectivos, mas também porque toda a organização seria mais aberta e menos… compartimentalizada), quer por os instrumentos utilizados para construir os rankings das escolas deixarem de fazer sentido (visto que se baseiam em notas internas e externas, que não existiriam…). Portanto, deixariam de ser os alunos os prejudicados por isto, visto que não haveria um “isto” para os prejudicar…

   E era isto que tinha para dizer. Sei que não é nada de novo (sobretudo esta última parte, mas tenho a necessidade quase médica de dizer coisas parecidas pelo menos uma vez por mês…), sei que também não é nada de particularmente interessante, mas foi o que produzi… Estejam à vontade, como sempre, para se expressarem, e, se os celebrarem, um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo (se não escrever mais nada entretanto…) a todos.

   Até à próxima entrada…