22 de abril de 2017

Do Ensino Especial

   Caríssimos leitores, por mais uma ausência, por mais um silêncio longo e indesejável, por mais um interregno vos peço as maiores e mais sentidas desculpas. Espero, por isso, poder, de algum modo, compensar-vos por intermédio da análise de um tema ainda francamente inédito, de entre os diversos que tenho abordado para aqui: o da educação especial, que é, para mim, o mesmo que dizer “o do ensino de alunos que apresentem limitações relativamente ao que a Medicina consideraria normal e/ou saudável”. Não sei se é bem esta a definição oficial, mas… espero que ande lá perto.

   É, no fundo, um tema moderadamente fracturante – e, talvez por isso, ou talvez causando isso, bastante importante e pertinente. Afinal, trata-se cidadãos que valem tanto como os outros, que importam tanto quanto os outros, mas que possuem uma certa dose de especificidades que necessitamos de ter em atenção, nomeadamente em termos das limitações que apresentam. Convirá, porém, destacar que o ideal, no fundo, seria que essas limitações não se verificassem, seja porque a Medicina fosse suficientemente evoluída para resolver os danos responsáveis por essas limitações, seja porque a tecnologia fosse suficientemente avançada para suplantar os efeitos dessas mesmas limitações. No estado em que nos encontramos actualmente (que, sem grande subjectividade, poderemos considerar ser ainda distante do ideal), não teremos outra hipótese que não a de tentar colmatar esses problemas, adoptando as práticas e os equipamentos às especificidades que eles possam provocar nos que os apresentam.

   Quando os problemas se resumem (infeliz expressão esta, que tão insensivelmente mascara as dificuldades que provocam…) a condicionantes de ordem física, no fundo, é relativamente simples descobrir o que fazer, tendo em conta que o nosso nível tecnológico já nos permite discernir formas de circundar uma parte significativa dessas limitações; refiro-me quer a questões de concepção das coisas, como a inclusão de rampas nos edifícios ou de sistemas indicadores das cores para os daltónicos, por exemplo, quer a questões de meios e métodos como a leitura de textos em voz alta, o uso de displays diversos com suporte para Braille (ainda que a tecnologia e o mercado o dificultem de algum modo, dado o elevado custo da maioria dos equipamentos disponíveis para esses fins) ou o recurso acompanhamento específico do aluno por parte de um profissional mais ou menos especializado, no intuito de o auxiliar. Natural, mas infelizmente, será mais ou menos inevitável que existam alguns conhecimentos, sobretudo do domínio desportivo e/ou físico, para cuja aquisição as limitações constituem impedimento (se me perdoam o vago pleonasmo), e, nesse sentido, acaba por ser, também, o dever do sistema de ensino apresentar alternativas adaptadas (no âmbito desportivo será o caso mais flagrante…) a cada um, de modo a que nunca ninguém fosse pura e simplesmente excluído.

   Nos casos em que os problemas atinjam, também, a componente mental, cerebral, do aluno, a situação torna-se fundamentalmente mais complicada, posto que a capacidade de os alunos aprenderem pode ser afectada, o que implica que, do ponto de vista funcional do sistema de ensino, poderão não conseguir ter o mesmo desempenho que os alunos não afectados. Aqui, devo confessar que a minha opinião diverge um pouco da que parece ser mais frequente e, em menor ou menor escala, aplicada hoje em dia; naturalmente que estou, como sempre, mais do que receptivo a críticas e (contra–)argumentos, mas, por agora, estou em crer que talvez não seja uma ideia universalmente vantajosa colocar indiscriminadamente (mais outra infeliz expressão, dada a polissemia do termo…) estes alunos juntamente com “turmas” da faixa etária apropriada, independentemente dos conhecimentos que uns e outros possam estar a adquirir, mesmo que seja sob o louvável pretexto da inclusão. Naturalmente, dependerá das circunstâncias, dos recursos disponíveis e das limitações em causa se estes alunos são colocadas em “turmas” próprias ou nas que correspondem aos conhecimentos que estão efectivamente a adquirir (e, acrescentaria eu, em caso de igualdade, deveremos sempre tentar optar pela segunda!), mas não me parece o pináculo da eficiência mantê-los junto aos restantes só para potenciar um convívio e uma confraternização que, de um modo geral, pertencem ao lado de fora e não propriamente ao lado de dentro das salas de aula (não é que os alunos devam ser propriamente autómatos dentro da sala de aula, antes pelo contrário, mas também o propósito de lá estarem não deve ser propriamente visto como sendo o de sociabilizar…). Devemos tentar ser o mais inclusivos possível, claro está, disso não pode haver dúvidas, marginalizar seja que segmento da sociedade ou da população for é sempre indesejável e, mais do que isso, perigoso, mas, dada a ausência do conceito de turma ao abrigo dos Mini-Ciclos de Leccionamento, e dada a maior disponibilidade dos alunos em termos de tempos livres (e com as alterações sociais e de mentalidade necessárias para tornar toda a sociedade verdadeiramente tolerante e inclusiva…), não me parece, de todo, ineficaz efectuar a devida integração fora das salas de aula e não dentro delas. Até porque, à partida, se deixará de conferir grande significado à turma, ao agrupamento de alunos a frequentar o mesmo mini-ciclo, porque será, intrinsecamente, de curta duração. Mais uma fez friso que, neste aspecto, tal como em todos os outros, estou receptivo a sugestões e argumentações, até porque, naturalmente, haverá leitores que poderão falar destes assuntos com muito mais propriedade do que eu…

   Uma última ressalva, ou um último aspecto: no que toca aos casos mais graves, em que o processo pedagógico assume contornos tão particulares que se torna extremamente difícil enquadrar as aprendizagens nos moldes prescritos pelas práticas lectivas usuais dos Mini-Ciclos de Leccionamento, também não vejo qualquer motivo para que nos oponhamos a que os professores e cuidadores desses alunos em particular tenham a possibilidade de lhes atribuir um dado mini-ciclo, se e quando acharem apropriado, para reflectir oficialmente o facto de terem conseguido efectuar uma dada aprendizagem. Tratando-se estes de casos graves, diria, até, que medicamente identificados, não creio que advirá daqui grande margem de manobra para falcatruas diversas, ainda para mais tratando-se de um assunto tão sério quanto este, ainda que, devo reconhecê-lo, haja essa possibilidade.

   E creio que será isto… Enfim, espero não ter sido demasiado indelicado, ou demasiado sucinto, ou demasiado confuso, ou demasiado impreciso na minha abordagem, mas devo confessar (ou, aliás, já o devia ter feito antes que não deixa de ser um tema sensível, que deve ser tratado com cuidado, e foi isso que tentei fazer. Se falhei nesse meu intuito, apresento as minhas mais sinceras e sentidas desculpas aos meus leitores.

   Portanto, fiquem bem, cuidem-se e até à próxima entrada…